
Como antecipado pelo ABCD JORNAL, o prefeito de Mauá, Marcelo Oliveira (PT), iniciou nesta segunda-feira (15/12) um processo de demissão em massa dos servidores aposentados que se mantinham ativos na administração. Os 544 funcionários exonerados foram comunicados verbal e informalmente por seus superiores (pessoalmente ou por telefone) de que deveriam procurar o RH.
Diante dos primeiros servidores que procuraram ajuda, o Sindserv (Sindicato dos Servidores) entrou com uma ação civil pública questionando a legalidade da medida e solicitando a preservação dos cargos. A ação também pede uma multa de R$ 10 mil diários por servidor.
Na manhã desta terça-feira (16/12), um carro de som do Sindserv estará em frente à Prefeitura para convocar os servidores para uma reunião à noite. A partir deste encontro, não se descarta uma definição por paralisação.
Apesar de a administração informar oficialmente que ainda “está fazendo o levantamento” do número de funcionários atingidos, a portaria 67.791 publicada nesta segunda-feira (15/12) pelo Diário Oficial de Mauá) elenca 544 servidores que serão demitidos ao longo desta semana. Até o momento, a GCM (Guarda Civil Municipal) foi o setor mais afetado com 40 guardas de um total de 200 na corporação.
Na Educação, foram 150 entre professores e funcionários administrativos, além de 127 na área da Saúde. Demais departamentos também foram afetados e o Sindserv cita na ação o prejuízo relacionado a serviços básicos para manter a cidade em pleno funcionamento.
“Temos uma grande preocupação com esse número de demissões porque o quadro da Prefeitura é muito enxuto. Temos elevado número de servidores aposentados de áreas essenciais como saúde, educação, segurança e até serviços urbanos que estão sendo dispensados. Vão faltar pessoas e não se faz concurso público em um estalar de dedos. Vamos trabalhar praticamente o ano inteiro com um quadro muito reduzido. Essa é uma preocupação do sindicato enquanto defensor da cidadania. Tem também o lado do servidor público que precisa do emprego e do salário”, disse o advogado do Sindserv, Carlos Alberto Zambotto.
O Sindicato também aponta para o fato de que demissões em massa têm de ser comunicadas anteriormente pela Prefeitura ao Sindserv, o que não foi feito. Zambotto fala, inclusive no risco de o prefeito Marcelo Oliveira enquadrar-se em improbidade administrativa por demissões ilegais.
Embasamento legal
O Sindserv baseia-se nas múltiplas interpretações que podem ter a lei complementar municipal 101/2002 que trata do estatuto dos servidores e diz que a aposentadoria é uma das hipóteses de vacância do cargo. O Sindicato rebate com a afirmação de que a lei municipal tem menos peso e que legislações maiores amparam os funcionários aposentados.
“Nosso departamento jurídico entende que quando eles se apegam ao artigo 33, o texto é muito básico. Cada servidor tem uma história, um regime contratual. Tem as opções do cargo em vacância. A aposentadoria é muito genérica porque tem motivos diferentes: contribuição, invalidez, especial, e a própria Constituição dá garantias para esses trabalhadores”, disse a presidente do Sindserv, Maralisa Torres Dias.

A resposta da Prefeitura
A Prefeitura afirma que as exonerações atendem a “recomendações judiciais e a entendimentos consolidados dos órgãos de controle e fiscalização. A medida decorre de obrigação legal e não de decisão administrativa ou política do Executivo municipal”.
Zambotto afirma que em nenhum momento o MP recomendou a demissão dos servidores e que o processo todo, em “ritmo normal” se estenderia por alguns anos.
“As exonerações têm como base o entendimento firmado pelo Supremo Tribunal Federal (STF) no julgamento do Tema 1150, concluído em 2022. A tese fixada pela Corte estabelece a impossibilidade de manutenção ou reintegração ao cargo de servidor público aposentado pelo Regime Geral de Previdência Social (INSS) quando a legislação local prevê a vacância do cargo em razão da aposentadoria”, continua a Prefeitura em nota enviada ao ABCD JORNAL.
“Desde 2021, a Prefeitura vinha sendo questionada pelo Tribunal de Contas do Estado de São Paulo (TCESP) e pelo Ministério Público, mas, à época, o município buscava alternativas jurídicas para sustentar a permanência dos servidores aposentados até o limite etário de 75 anos. Em junho de 2025, o TCESP notificou formalmente o município após representação apresentada por um ex-servidor — denúncia que já havia sido protocolada também em 2024. O Tribunal apontou a procedência da representação e indicou que a situação poderia gerar impactos relevantes na análise das contas municipais, já refletidos na avaliação do primeiro semestre deste ano. Paralelamente, o Ministério Público recebeu a mesma representação e solicitou informações sobre as providências que seriam adotadas pela administração municipal.”
“Diante desse cenário, pareceres técnicos da Procuradoria Geral do Município e da Controladoria Interna concluíram pela impossibilidade jurídica de manter nos cargos os servidores estatutários aposentados pelo INSS, reforçando a necessidade de observância da legislação e dos entendimentos dos órgãos de controle.”
Ainda segundo a administração municipal, todos os servidores exonerados terão assegurado o pagamento integral das verbas rescisórias e direitos previstos em lei, conforme a legislação vigente.
A origem da história
A situação teve origem em uma denúncia feita por Sidney Rogério, que se autodenomina cidadão comum. Ele diz que acessou o portal da transparência e se deparou com um total de 7 auditores fiscais, com salários de R$ 20 mil em média, aposentados entre 2019 e 2021 que continuaram trabalhando normalmente. Foram estes servidores o alvo da denúncia inicial que Sidney protocolou em junho deste ano no Ministério Público.
“Estes servidores aposentados voluntariamente estão acumulando cargo de forma indevida já que o artigo 37, incisos II e XVI da Constituição proíbem o acúmulo remunerado de cargo público em regra geral. O STF já tratou dessa matéria no tema de repercussão geral 1150 e o que vai definir essa questão de acumular ou não remuneração no mesmo cargo é a legislação local”, disse Sidney à reportagem do ABCD JORNAL e também em sua representação no MP.
Posteriormente, foi o próprio secretário de Assuntos Jurídicos da Prefeitura, Matheus Martins Sant’Anna, quem aumentou exponencialmente o número de envolvidos a partir de uma manifestação em videoconferência com o Ministério Público. O secretário revelou ao MP que assim como os auditores, existiam inúmeros outros servidores na mesma situação. Em sua manifestação na representação e para os promotores, Sant’Anna afirmou que a municipalidade já tinha a intenção de demitir os servidores de diferentes áreas.
