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Demolição de observatório descontenta astrônomos e conselho de Diadema

Decisão da Prefeitura surpreende comunidade gerando mal-estar entre administração e acadêmicos, além de boatos sobre futuro

  • Demolição de observatório descontenta astrônomos e conselho de Diadema. Fotos: Ozimar Pereira/ Loli Gagliardi
  • Por: Juliana Finardi
  • Publicado em: 24/01/2024
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Decisão da Prefeitura surpreende comunidade gerando mal-estar entre administração e acadêmicos, além de boatos sobre futuro

observatório de Diadema

Demolição de observatório descontenta astrônomos e conselho de Diadema. Fotos: Ozimar Pereira/ Loli Gagliardi

Após 32 anos de existência, entre idas e vindas com períodos de glória e outros de abandono e sucateamento (com um último suspiro no meio do caminho), o observatório astronômico de Diadema foi demolido para dar lugar a uma creche.

O local, que fica no Jardim Inamar, não abrigava somente o observatório, mas um complexo composto por um centro cultural, biblioteca, quadra e até um laboratório fotográfico onde aconteciam oficinas, cursos e demais atividades e a cena cultural fervia em meados da década de 90. A inauguração do observatório, inclusive, lá em 1992, atraiu a atenção da grande imprensa nacional, que se deslocou em peso para Diadema no histórico 26 de dezembro.

O físico e astrônomo pela USP, Ozimar Pereira, idealizador do observatório e fundador da SAAD (Sociedade de Astronomia e Astrofísica de Diadema), lembra que naquele dia não parou de dar entrevistas, explicar como surgiu a ideia e o projeto, e que viveu os tempos áureos do observatório.

Alguns anos antes, em 1986, o assunto astronomia entrou no cotidiano de muita gente que esperou o cometa Halley passar pela Terra e colocou o tema literalmente nas alturas. Mais adiante veio a ideia da sociedade de astronomia para logo em seguida surgir uma “vaquinha analógica”, como brinca Pereira, que arrecadou incríveis 1 mil dólares para a compra do telescópio.

“Conseguimos 930 dólares em notas e 70 em moedas. Depois, enquanto cogitávamos construir um observatório na laje da casa de um aluno, no Jardim Inamar mesmo, que é uma das áreas mais altas da cidade, uma conversa minha com o então prefeito José Augusto da Silva Ramos rendeu a instalação do telescópio dentro de um complexo cultural que ele planejava fazer e acabou nascendo o observatório”, conta Pereira em detalhes que envolveram vontade política e uma certa “briga” com alguns políticos daquela administração até sair o resultado final com as ordens do próprio prefeito.

observatório de Diadema - inauguração

Inauguração do observatório, inclusive, lá em 1992, atraiu a atenção da grande imprensa nacional, que se deslocou em peso para Diadema no histórico 26 de dezembro. Foto: Ozimar Pereira/Arquivo pessoal

Já em 2016, porém, todas as atividades do centro e da biblioteca foram remanejadas do endereço na avenida Antonio Sylvio Cunha Bueno para o CEU, também no Jardim Inamar, com a justificativa de uma revitalização do local. As atividades jamais retornaram para o local de origem e o local nunca foi revitalizado. Pelo contrário, permaneceu por um tempo abandonado e na pandemia, invadido e depredado.

Surpresa desagradável

Tanto a demolição, porém, agora na segunda semana de janeiro deste ano, quanto o novo destino da área pegaram de surpresa astrônomos e representantes de conselho de patrimônio histórico da cidade.

“O prédio é um patrimônio cultural e não deveria ser demolido sem passar pelo grupo técnico de apoio ao conselho. Apesar de não ser tombado, tratamos o bem como se fosse. Esses imóveis têm as mesmas restrições administrativas de um tombado. Lá era um centro de cultura que foi se deteriorando, a sociedade de astrônomos e astrofísicos acabou e afastando e o que não se cuida, se perde”, lamenta a presidente do Conselho Municipal do Patrimônio Histórico da cidade, Maria Luisa Gagliardi, a Loli.

Ela conta também que o conselho só soube da decisão da Prefeitura quando a demolição já havia acontecido, o que surpreendeu não apenas pela atitude como também pela falta de diálogo. O Pró-Iphac (Grupo Técnico de Estudos dos Bens Culturais), que é um órgão do conselho, reuniu-se na semana seguinte à demolição com secretários municipais de Cultura, Educação, Obras e Serviços Urbanos, Habitação e Governo para discutir o assunto.

“Demoliram, explicara e nos deram a notícia de que estão com o telescópio lá na Secretaria de Educação. Fizemos um pedido oficial para vistoriar o objeto e pedimos alguma compensação. Então eles foram dando sugestões como alguma menção no nome da creche, e chegaram a falar que alguém fez um laudo constatando que o local era impróprio, de difícil observação. É óbvio que ninguém e contra a construção de uma creche, mas não queremos perder o observatório e esperamos que um dia volte a funcionar”, diz Loli.

Ozimar diz que o céu de Diadema “é tão ruim hoje quanto nos anos 90” e que o tal laudo não passa de conversa sem comprovação científica alguma. Para ele, o fato de um observatório com tanta atividade ter funcionado por todo esse tempo já é “um milagre” que deixa como legado muitos registros e termina por fazer história.

“Isso vai ajudar a construir muita coisa. Ajudamos os estudantes, fizemos um bom trabalho, mas acabou. Devemos agora voltar os olhares para o que resta de patrimônio histórico na cidade. Se a Prefeitura destruiu todo esse centro cultural na cara do conselho e inventa um monte de mentira, amanhã destroem todo o resto”, critica o físico.

Justificativa

A Prefeitura diz que a estrutura dos prédios estava “seriamente comprometida após anos de abandono”. “A reforma, conforme foi estudado pela atual gestão nos últimos meses não se mostrou viável. Por esse motivo, os prédios foram demolidos.”

A administração também confirma estar em posse dos equipamentos que estavam no local como o telescópio, agora em posse da Secretaria de Educação.

Ainda de acordo com a nota da Prefeitura, a creche que deve ser construída no local teve seu projeto apresentado para o governo federal e pleiteia verbas do PAC (Programa de Aceleração do Crescimento). Será um equipamento com cinco salas e capacidade para atender 94 crianças em tempo integral.

observatório abandonado

Prefeitura diz que a estrutura dos prédios estava “seriamente comprometida após anos de abandono. Foto: Reprodução

Boatos e o futuro

Nesse intervalo de tempo entre a demolição e as explicações e críticas, circularam boatos de que a Unifesp (Universidade Federal de São Paulo), que tem um campus em Diadema, seria responsável, através de um acordo com a Prefeitura, pela construção de um novo observatório, mas as conversas mudaram de rumo posteriormente.

Também por meio de nota, a Prefeitura informou que o termo de cooperação firmado com a Unifesp prevê a retomada do ensino de astronomia através da capacitação de professores para o atendimento de estudantes. “A própria Unifesp realizou vistorias no observatório e constatou que não havia condições técnicas”, explica a secretária de Educação, Ana Lucia Sanches.

A Unifesp confirma o acordo de cooperação técnica, mas afirma desconhecer os motivos pelos quais o prédio foi abandonado e demolido, “pois não tem relação com o prédio em questão”.

A universidade também diz que o acordo prevê ações de ensino, pesquisa e extensão e que “espera-se o aprimoramento dos processos de ensino-aprendizagem na rede municipal de ensino de Diadema, tal qual o aprimoramento dos profissionais de educação e o estímulo para a formação de novos professores no campo da astronomia, práticas científicas de observação astronômica e experimentação científica, vivências de práticas observacionais, aulas-passeio e estudos do meio em observatórios e planetários como Sabina, Planetário do Ibirapuera e Cientec-USP”.

A Unifesp diz não ter informação sobre a construção de um novo observatório em Diadema “tampouco quando e onde será”.